Segue abaixo parecer técnico jurídico a respeito de:

 

1- Prestação de serviços de motofrete por meio de MEI

2 - Risco na contratação de empresa inidônea

3 - Responsabilidade objetiva em acidente de trabalho

 

 

PARECER JURÍDICO

 

CONTRATO DE MOTOFRETISTAS

CONTRATAÇÃO DE MEI. VÍNCULO EMPREGATÍCIO.

TERCEIRIZADA INIDÔNEA. RISCOS.

ACIDENTE DURANTE TRABALHO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR.

 

I - RELATÓRIO

 

            Conforme pedido de esclarecimentos, segue abaixo parecer técnico jurídico a respeito da (1) prestação de serviços de motofrete por meio de MEI; (2) risco na contratação de empresa inidônea; (3) responsabilidade objetiva em acidente de trabalho.

 

 

II – FUNDAMENTAÇÃO

 

1 – Prestação de serviços de motofrete por meio de MEI

 

            Especificamente em relação ao MEI, a matéria muito se assemelha ao trabalho autônomo, pois na prática também pode decorrer de contrato de prestações de serviços por uma pessoa física. A diferença é que há apenas a formalidade de ser por meio de uma empresa constituída (MEI).

 

            É sabido que muitas empresas se utilizam de tal medida, conhecida como “pejotização”, a qual mira a redução dos custos oriundos do fiel cumprimento à legislação trabalhista e o aumento da margem de lucro da empresa, mas se deve estar ciente dos riscos inerentes.

           

            A lei da terceirização e a própria reforma trabalhista não revogaram nenhum dispositivo da CLT quanto à verificação da existência de vínculo de emprego, de modo que permanecem vigentes e intocáveis os conhecidos e cumulativos pressupostos: a subordinação, a não eventualidade, a alteridade, a pessoalidade e a onerosidade.

            De acordo com o pressuposto da pessoalidade, em suma, as atribuições inerentes à pessoa física são essenciais para sua contratação, pelo que não poderá se fazer substituir. A onerosidade é a respeito do pagamento da contraprestação em pecúnia.

 

            Quanto à não eventualidade, destaca-se que não tem relação direta com frequência ou dias da semana trabalhados, visto que o trabalho em apenas um dia por semana já pode ser suficiente para caracterizar a habitualidade da prestação de serviço, mas sim, trabalho não-eventual é aquele que não é circunstancialmente necessário, como numa emergência, mas naturalmente inserido no dia a dia do empreendimento econômico.

 

            Já a subordinação é de acordo com o poder diretivo do empregador, com o qual este pode impor diretrizes quanto à forma de execução dos trabalhos, sob pena de medidas disciplinares, por exemplo. Relacionado a este, é a alteridade, segundo o qual os riscos da atividade econômica são somente do empregador, não podendo, por exemplo, repassar aos empregados os prejuízos.

 

            Nesse sentido, salienta-se que na Justiça do Trabalho prevalece o princípio da primazia da realidade sobre a forma, segundo o qual, independentemente do que apresentam os atos e negócios jurídicos, deve-se considerar a realidade fática.

 

            Em relação ao MEI, a resolução que dispôs sobre esta (RESOLUÇÃO CGSN Nº 140, DE 22 DE MAIO DE 2018) também é muito clara em seu art. 114, pois assim dispõe:

 

Art. 114. Na hipótese de o MEI prestar serviços como empregado ou em cuja contratação forem identificados elementos que configurem relação de emprego ou de emprego doméstico: (Lei Complementar nº 123, de 2006, art. 2º, inciso I e § 6º; art. 3º, § 4º, XI; art. 18-A, § 24, art. 18-B, § 2º; Lei nº 8.212, de 1991, art. 24, parágrafo único)

I - o MEI será considerado empregado ou empregado doméstico e o contratante ficará sujeito às obrigações decorrentes da relação, inclusive às obrigações tributárias e previdenciárias; e

II - o MEI ficará sujeito à exclusão do Simples Nacional.

 

            Em relação ao trabalhador autônomo e MEI, deve ser analisado caso a caso, com o objetivo de adequar à necessidade da empresa, sem colocar em risco em razão de passivo trabalhistas.

 

            Isto é, não se pode generalizar a prestação de serviços por meio de MEI, de modo que a empresa adote de forma descabida e irregular de contratação de pessoal.

 

 

2 – Riscos na contratação de empresa terceirizada inidônea

 

            Tanto a Súmula 331, do TST, quanto a Lei n. 6019/1974 são cristalinas no sentido de que a empresa contratante é responsável subsidiária pelas obrigações trabalhistas e previdenciárias sobre o período em que ocorrer a prestação de serviços, senão vejamos, respectivamente:

 

Súmula nº 331 do TST

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.

IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
 

Lei n. 6019/1974, Art. 5:

§ 5o  A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991

 

            Em resumo, responsabilidade subsidiária significa dizer que se a empresa contratada não honrar com as obrigações trabalhistas e previdenciárias de seus empregados, eventual condenação em ação trabalhista poderá direcionar à tomadora dos serviços, ou seja, a empresa contratante.

 

            Em muitos casos ocorre de a empresa tomadora de serviços honrar integralmente com suas obrigações trabalhistas, mas caminhar à falência, devido a condenações subsidiárias astronômicas, oriundas de ações dos empregados terceirizados.  

 

            Por isso, para uma terceirização adequada é recomendada a certificação da contratação de uma empresa prestadora de serviços (terceirizada) idônea, que cumpre a legislação trabalhista, pois a tomadora tem responsabilidade subsidiária e, mesmo que a terceirização seja lícita, pode ter que arcar com os encargos trabalhistas e previdenciários dos empregados caso a terceirizada não os cumpra.

 

3 – Responsabilidade objetiva do empregador no acidente de trabalho

 

            Neste item, primeiramente se faz necessária a diferenciação entre responsabilidade subjetiva e objetiva. Na primeira, é imprescindível a análise e ocorrência da culpa do empregador. Na segunda a responsabilidade do empregador é independente de culpa.

 

            O Código Civil define que quando há atividade de risco a responsabilidade da indenização é independentemente de culpa, isto é, trata-se de responsabilidade objetiva, senão vejamos:

 

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

 

            Ocorre que a CLT expressamente considera a atividade de motocicleta como perigosa no seguinte artigo:

 

Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: 

(...)

§ 4o São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta.  

 

            Por isso, como regra geral, entende a Justiça do Trabalho que na ocorrência de acidente de trabalho na atividade de motocicleta, a responsabilidade do empregador é objetiva, isto é, independe de culpa. Nesse sentido:

 

ACIDENTE DE TRABALHO. ACIDENTE DE MOTO. LESÕES CICATRICIAIS NA PERNA DIREITA. RISCO DA ATIVIDADE LABORAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPREGADORA. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. Fica configurada a responsabilidade objetiva da reclamada pelo acidente de trabalho, quando o caso é de risco inerente à própria atividade exercida pelo reclamante, qual seja, a de motociclista em via pública, a serviço da empregadora. Precedentes. Recurso de revista a que se dá provimento.

(TST - RR: 3572720125030106, Relator: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 19/03/2014, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 21/03/2014)

 

            De fato, existe possibilidade de excludente da responsabilidade quando comprovada a culpa exclusiva, conforme seguinte decisão:

 

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE. ACIDENTE DE MOTO. CULPA EXCLUSIVA DO TRABALHADOR. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA EMPRESA RÉ. Não há como se reconhecer a responsabilidade objetiva da Reclamada, com base no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, para fins de condená-la ao pagamento da indenização por danos morais. Não obstante o trabalho desenvolvido pelo Empregado para o Empregador, com o uso de motocicleta, seja considerado como atividade de risco, os elementos dos autos evidenciam que o acidente decorreu de culpa exclusiva do Reclamante. Recurso Ordinário a que se nega provimento. (Processo: ROT - 0001566-51.2017.5.06.0145, Redator: Eneida Melo Correia de Araujo, Data de julgamento: 10/12/2019, Segunda Turma, Data da assinatura: 10/12/2019)

(TRT-6 - RO: 00015665120175060145, Data de Julgamento: 10/12/2019, Segunda Turma)

 

            Ocorre que, até mesmo quando comprovada a culpa de terceiro, não haverá excludente da responsabilidade objetiva do empregador. Nesse caso, o empregador poderá buscar ressarcimento do terceiro culpado, como mostra a seguinte notícia de decisão do Tribunal Superior do Trabalho: http://www.tst.jus.br/noticias/-/asset_publisher/89Dk/content/empregador-tem-responsabilidade-por-acidente-com-moto-apesar-da-culpa-de-terceiro?inheritRedirect=false

 

            Por isso, reforça-se a recomendação de contratação de uma empresa prestadora de serviços (terceirizada) idônea, que cumpre a legislação trabalhista, especialmente em relação à certificação, treinamentos e segurança dos motofretistas.

 

 

III – CONCLUSÃO

 

            Pelo exposto, conclui-se que apesar das inovações trazidas pelas alterações legais, quanto ao MEI, não houve revogação ou alteração dos artigos 2º e 3º, da CLT (que tratam sobre o vínculo de emprego), de modo que permanecem mantida verificação dos requisitos para caracterização de relação empregatícia.

 

            Ainda, recomenda-se contratação de empresa terceirizada idônea, que cumpre a legislação trabalhista, pois a tomadora tem responsabilidade subsidiária e pode ter que arcar com os encargos trabalhistas e previdenciários dos empregados caso a terceirizada não os cumpra.

            Ademais, como regra geral, entende a Justiça do Trabalho que na ocorrência de acidente de trabalho na atividade de motocicleta, a responsabilidade do empregador é objetiva, isto é, independe de culpa.

 

            Há possibilidade de excludente da responsabilidade quando comprovada a culpa exclusiva, mas quando comprovada a culpa de terceiro, não haverá excludente da responsabilidade objetiva do empregador. Nesse caso, o empregador poderá buscar ressarcimento do terceiro culpado.

 

            É o parecer.

 

Curitiba, 27 de abril de 2021.